Investigação sobre compra de armas rastreou conversas que mostram a rotina de luxo do traficante Fhillip da Silva Gregório, o Professor, de 36 anos, dentro de favela do Rio

Considerado o principal comprador brasileiro do maior contrabandista de armas da América do Sul, Fhillip da Silva Gregório, o Professor, tinha uma rotina de luxo dentro do Complexo do Alemão, Zona Norte do Rio, segundo investigação da Polícia Federal. Mensagens e fotos anexadas ao inquérito mostram que ele vivia em uma casa confortável na favela e ainda usufruía de procedimentos estéticos. A lista inclui lipoaspiração na barriga, implante capilar e clareamento dentário.

O suspeito de ser responsável por comprar fuzis e pistolas para o Comando Vermelho foi alvo de um mandado de prisão preventiva na semana passada, no inquérito que identificou movimentação financeira de R$ 1,2 bilhão pela quadrilha em três anos. Ele ainda não foi localizado e é considerado foragido. Procurada, a defesa não retornou aos contatos.

Nas mensagens, as quais O GLOBO teve acesso, Professor deixa claro que não sai da comunidade há pelo menos três anos. Em uma das conversas com uma mulher, por volta de 3h de 19 de março do ano passado, ele conta estar no baile funk na localidade conhecida como Fazendinha. 

A interlocutora então pergunta se ele se “sente” ao ouvir seu nome nas músicas e o traficante então responde: “Fico sem graça, sinto não. Eu não saio de dentro do morro tem três anos. Quem me dera dormir a essa hora. Não dá mesmo. Ainda estou no trabalho. Chega em casa e fico esperando para ver se vai ter operação ou não”.

No dia 25 de janeiro de 2022, Professor envia a um contato: “Esperando ficar pronto, que vou mexer no dente”. Após elencar diversos gastos, como “depósito doutora”, “material dentário” e “clínica”, ele envia duas fotos em que sua boca aparece com uma cobertura verde e outra que mostra parte de um equipamento odontológico.

Em 13 de setembro do mesmo ano, Professor escreve a uma mulher: “Também fiz uma parada estética hoje. “Melhoria no rosto com fio de PDO”. O procedimento consiste na aplicação de compostos de polidioxanona para promover um efeito de tração na pele do rosto e estimular a produção de colágeno na região. A interlocutora então diz: “Mentiraaa! Sério que não vai deixar eu ver?” Ele então a envia uma foto em que exibe um profissional com uma pinça na altura de seu maxilar.

A investigação, sob responsabilidade da PF da Bahia, também rastreou quatro fotos que mostra Professor sendo submetido a um implante capilar dentro da sua casa, na Fazendinha. Nas imagens, ele aparece deitado em uma maca enquanto pelo menos duas mulheres, equipadas com luvas e jalecos, realizam incisões com um equipamento em sua cabeça.

Os investigadores também identificaram que Professor recebeu atendimento médico em casa. Em uma das ocasiões, em 17 de agosto de 2021, ele enviou fotos de remédios e de seus braços com acessos venosos em um diálogo por WhatsApp. Na conversa, ele disse que estava com pressão alta e dor de cabeça e a médica havia lhe informado que ele ficaria uma semana internado. “Tô de molho”, escreveu.

Imagens rastreadas pela PF dão conta ainda de uma lipoaspiração na barriga realizada por Professor. A cirurgia plástica para retirada de gordura abdominal com cânulas foi fotografada e filmada em um quarto onde aparece uma televisão e uma geladeira. Em uma das mídias, um profissional pergunta se ele está sentindo dor.

Nós diálogos interceptados, Professor também exibe o poder sob os moradores do Alemão. Em um dos trechos, uma mulher que promove eventos sociais na comunidade pede autorização para dar uma entrevista a uma equipe de TV sobre a paralisação do teleférico que cruza a favela. “Não, não pode pedir teleférico de volta não, a gente não quer”, responde Professor.

Em outra conversa, um homem que seria coronel da Polícia Militar solicita a devolução de motos roubadas a Professor. “Fala mano, beleza? Veja se pode me ajudar”, escreve o suposto oficial antes de encaminhar os modelos dos veículos.

Durante as negociações sobre compra de drogas e armas com a quadrilha paraguaia que também foi alvo da operação da PF, Professor chega a receber informações e imagens dos produtos. A um dos vendedores, ele pergunta se o armamento possui o chamado kit rajada e envia fotos de maços de dólares. “Dinheiro não será problema”, escreve.

No inquérito sobre a importação de armas dos países europeus pelo Paraguai e a posterior venda para facções criminosas do Brasil, ainda há conversas sobre a transferência de policiais, a fabricação de drogas e operações das forças de segurança do Rio.

O traficante já havia sido preso pela PF, em 2015, por contrabando de drogas e armas. Na época, as investigações mostraram que ele tinha contatos comerciais no Paraguai, Peru, Bolívia e Colômbia. Condenado a 14 anos, deixou a cadeia em 2018, após receber o benefício da Visita Periódica ao Lar e não mais retornar ao Instituto Penal Edgard Costa.


Fonte: O GLOBO