Avaliação da campanha do prefeito é que a vitimização do ex-coach pode ter sido exagerada, sobretudo ao comparar nas redes a cadeirada à facada sofrida por Bolsonaro

Prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, candidato à reeleição, durante sabatina O Globo, Valor e CBN — Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

Não tinha como ser diferente. Não depois do que havia acontecido na noite anterior no debate na TV Cultura. A cadeirada de Datena em Pablo Marçal ainda era o assunto do momento na manhã cinzenta, fria e úmida que, depois de dias de calor insuportável, enfim tornava o ar de São Paulo respirável novamente. Foi neste clima de aguardado alívio que o prefeito e candidato à reeleição, Ricardo Nunes, chegou ao estúdio da CBN para participar da sabatina.

Admitindo ter dormido umas poucas horas, mas mostrando-se disposto e não escondendo a animação com a situação toda, Nunes apressou-se em lamentar a atitude do tucano, mas sem deixar escapar o sorriso maroto e a oportunidade de criticar o comportamento de Marçal. Para o prefeito, Datena explodiu devido a uma sequência de provocações inaceitáveis de Marçal. Para ele, dessa vez, o ex-coach foi longe demais. O que, no fim das contas, pode ter beneficiado Nunes, que agradeceu aos céus por não ter sido ele o alvo de tanta baixaria.

Na estratégia de Marçal, ao desestabilizar Datena para mostrá-lo como uma pessoa desequilibrada para administrar São Paulo, o objetivo do ex-coach era levar para si todos os 6% de votos do apresentador, que, na sua avaliação, iria jogar definitivamente a toalha e sair de cena. Errou.

O que o candidato do PRTB não contava é que Datena não apenas não desistiu, como a atitude de Marçal chegou a gerar um efeito reverso, com uma enxurrada de avaliações positivas para o apresentador. No fim do dia, Datena acumulava menções positivas nas redes sociais, algo inédito para um candidato que pouco frequenta o ambiente digital. 

Nunes tinha assim motivos para comemorar, ao menos por ora, o deslize estratégico do candidato do PRTB, que teria acabado de mãos vazias. Some-se a isso o fato de o principal rival do prefeito na disputa pelos votos mais à direita ter assumido, dias antes, a indesejada liderança entre os candidatos mais rejeitados, com 44% de acordo com o Datafolha.

A avaliação da campanha de Nunes é que a vitimização de Marçal pode ter sido exagerada, sobretudo ao comparar nas redes a cadeirada à facada sofrida por Bolsonaro e ao atentado a tiros contra Donald Trump na Pensilvânia. Para quem teve como diagnóstico “traumatismo na região do tórax e em punho, sem maiores complicações”, de acordo com o boletim médico, o socorro de ambulância e a internação em hospital de alto padrão soaram desnecessários, incabíveis até mesmo em um episódio de ER ou Grey’s Anatomy. E o eleitor já teria percebido isso.

Foi neste clima de otimismo que Nunes entrou no estúdio e enfrentou por uma hora questionamentos sobre diversos temas. Em um deles, sobre o apoio de Bolsonaro, que passou a se mostrar mais presente, ainda que por vídeo, na sua campanha, Nunes respondeu que não houve qualquer mudança de estratégia. Tudo está dentro do acordado, diz. 

Na verdade, Bolsonaro vinha hesitando em descer do muro no qual se equilibrava, mas foi impelido a escolher um lado após o 7 de Setembro, quando Marçal tentou “lacrar” ao chegar logo após o fim do discurso do ex-presidente, evitando, segundo o organizador do ato, o pastor Silas Malafaia, se indispor com o ministro Alexandre de Moraes, alvo principal dos bolsonaristas na Paulista.

Se ficou escondido na avenida, Nunes definitivamente não foge dos holofotes quando está ao lado do governador Tarcísio de Freitas, seu principal cabo eleitoral. Ele o acompanha em eventos evangélicos, numa estratégia que visa a sua consolidação em um segmento onde briga cabeça a cabeça com Marçal e no qual, após a cadeirada, espera ampliar a vantagem.

Também conta a seu favor a enorme quantidade de inserções na TV, usadas de forma sistemática para atacar diretamente Marçal. O resultado da junção de todos esses fatores apareceu na última pesquisa Datafolha, que mostrou sua ascensão de 22% para 27%, enquanto Marçal oscilou de 22% para 19%. O prefeito também fez questão de lembrar que é o único que vence com folga no segundo turno qualquer um dos adversários mais bem colocados, marcando 53% a 38% contra Boulos e 59% a 27% contra Marçal nas intenções de voto.

Após sessenta minutos de sabatina, Nunes despediu-se de forma cortês, confiante de que teve um bom desempenho, que, se não foi incrível, também não o comprometeu no balanço final. Enquanto isso, a agora superstar “#cadeirada” continuava a bombar em memes e posts no WhatsApp, Bluesky, Instagram e Threads. Resta saber qual será o efeito imediato nos próximos debates, marcados para hoje e sexta-feira, e nas pesquisas Quaest e Datafolha desta semana. De tudo isso, apenas uma certeza: melhor evitar qualquer tipo de cadeira, poltrona ou banquinho em cena. Ou não.


Fonte: O GLOBO