Anúncio foi feito durante conferência de oceanos na cidade do Panamá; John Kerry, enviado especial de Biden para o clima, participou do evento após viagem ao Brasil

Os riscos que as atividades humanas representam à saúde dos oceanos foi tema da abertura da conferência Nosso Oceano, sediada neste ano na Cidade do Panamá. Centenas de milhões de dólares em compromissos e promessas não vinculantes marcaram o evento, que trata de temas-chave para os mares, do combate às mudanças climáticas à pesca ilegal, passando pela mineração submarina e pelo excesso de plástico no mar.

Um dos maiores anúncios foi feito pela União Europeia, que anunciou 39 compromissos equivalentes a 816,5 milhões de euros (R$ 4,5 bilhões). Representada no evento por seu comissário de Meio Ambiente, Virginijus Sinkevičius, o bloco anunciou cerca de 320 milhões de euros (R$ 1,8 bilhão) para pesquisas oceânicas que protejam a biodiversidade e contenham os impactos das mudanças climáticas para os oceanos.

O bloco também anunciou 250 milhões de euros (R$ 1,4 bilhão) para o lançamento do satélite Sentinel-1C, que observará o degelo no Ártico e monitorará os impactos da crise climática. Haverá ainda US$ 126 milhões (R$ 694 milhões) para proteger a biodiversidade e lutar contra as mudanças climáticas no Benin, na Guiana e na Tanzânia.

Há também verbas para reforçar o combate à pesca ilegal, tanto por meio de autoridades regionais que monitoram as atividades, mas também por meio de mecanismos da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Criada pelo Departamento de Estado americano, a conferência está em sua 8ª edição e, até o momento, já garantiu cerca de 1,8 mil compromissos que equivalem a aproximadamente US$ 108 bilhões (R$ 561,7 bilhões). O enviado especial do clima, John Kerry, voou do Brasil, onde esteve no início da semana em reuniões com o vice-presidente Geraldo Alckmin e uma série de ministros, diretamente para o país centro-americanos:

— Estamos aqui para falar do que talvez seja, e nem talvez assim, o maior desafio que a Humanidade já enfrentou (...). A crise climática e a crise dos oceanos são a mesma. Não podemos responder a uma sem falar da outra — disse Kerry, que criou a conferência em 2014 quando era secretário de Estado do então presidente Barack Obama. — A crise que vivemos hoje vem das emissões incessantes. Não precisamos de um cientista espacial para traduzir isso.

Os Estados Unidos são sozinhos responsáveis por cerca de um quarto de toda a poluição despejada na atmosfera desde a Revolução Industrial, percentual que é quase o dobro da China, que ocupa o segundo lugar. Pequim é hoje a maior responsável pelas emissões globais, seguida por Washington, que sob o comando do presidente Joe Biden tenta assumir um inédito protagonismo na diplomacia ambiental.

Kerry anunciou o início de conversas para criar corredores marítimos ecológicos para navios mercantes em conjunto com o Panamá, a nação insular de Fiji e a Associação de Transporte Marítimo Pacific Blue. O objetivo da Organização Marítima Internacional é cortar as emissões de carbono do setor pela metade até 2030 e por 70% até o meio do século, em comparação com os níveis de 2008.

Os americanos também anunciaram investimentos adicionais de US$ 3 milhões para ajudar esforços que protegem reservas de corais e US$ 1,9 milhão em doações para projetos de conservações dos recifes. Os valores são considerados modestos e a conferência não tem teor vinculante, mas ainda assim ocupa um papel-chave na agenda de quem tenta preservar os mares.

— A conferência dá à comunidade internacional uma chance de se juntar e conversar. Ela é movida por compromissos, e as pessoas querem mostrar o que irão fazer para salvar o oceano — disse Tony Long, diretor executivo da Global Fishing Watch, organização que usa dados para monitorar a pesca. — Se estamos fazendo algo similar a alguém, podemos juntar forças e coordenar para dar aos países que querem preservar os oceanos o que precisam.

Em meio às reuniões, o país-sede prometeu que irá conservar mais de 54% do oceano dentro de sua zona econômica especial — ou seja, 200 milhas náuticas (370 km) a partir da costa. Já a França anunciou 400 milhões de euros para pesquisas científicas para preservar os oceanos. Israel, por sua vez, disse que irá dobrar suas áreas de proteção marítima.

O Reino Unido disse que vai investir 1,5 milhões de libras na iniciativa Blue Pacific Finance Hub, do Banco de Desenvolvimento da Ásia, cujo objetivo é aumentar os investimentos no oceano para construir economias mais azuis. A secretária de Meio Ambiente britânica, Thérèse Coffey, também afirmou que Londres irá investir mais 24 milhões de libras no Fundo Global para os Corais.

Os britânicos também foram o primeiro a aderirem a uma iniciativa do Fórum Monetário Internacional chamada Parceria de Ação do Carbono Azul, que almeja auxiliar na conservação dos oceanos, com um anúncio de 4 milhões de libras. O Brasil não tem representante oficial no evento.

Ecossistemas costeiros como mangues e pântanos salgados são capazes de armazenar até cinco vezes mais carbono que florestas tropicais, capacidade batizada de “carbono azul”. Sua conservação, portanto, é essencial, e a meta do projeto britânico é trabalhar com países, empresas e comunidades para catalisar esforços que desenvolvam o carbono azul e seus mercados de forma sustentável.

Com mais de 600 participantes, a conferência deste ano gira ao redor de seis áreas de ação: mudanças climáticas, pesca sustentável, economias azuis sustentáveis, áreas marinhas protegidas, segurança marítima e poluição marítima. Os plásticos que poluem os oceanos e o turismo sustentável, em particular, são duas questões-chave.

Todas elas são essenciais para o compromisso 30x30, acordado no ano passado durante a 15ª conferência da biodiversidade da ONU, a COP15. Mesmo que em termos ainda vagos, ele prevê que até 2030 o planeta tenha 30% de sua cobertura terrestre e oceânica transformada em reservas e territórios protegidos.


Fonte: O GLOBO