Ministro vai se aposentar em maio, e briga para substituí-lo na Suprema Corte está aberta

Porto Velho, RO - A iminente aposentadoria do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), que ocorrerá em maio, deu a largada na disputa pela primeira nomeação que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fará para a Corte desde a sua volta ao Palácio do Planalto. Dois advogados despontam como favoritos na corrida: Cristiano Zanin, que representa o próprio petista nos tribunais, e Manoel Carlos de Almeida Neto, ex-chefe de gabinete de Lewandowski.

A dupla, contudo, não está sozinha no páreo. Quatro ministros figuram entre os cotados. São eles Luís Felipe Salomão, Mauro Campbell e Benedito Gonçalves, os três do Superior Tribunal de Justiça (STJ), além de Bruno Dantas, atual presidente do Tribunal de Contas da União (TCU). Entre magistrados do STF ouvidos pelo GLOBO, a expectativa é de que a batalha se intensifique após o carnaval.

Lewandowski chegou à Corte por indicação de Lula em 2006 e vai deixá-la, compulsoriamente, ao completar 75 anos, a idade limite para permanecer no tribunal. A cadeira que ficará vaga é considerada estratégica para o Palácio do Planalto. Além de ser o integrante do STF que mantém interlocução mais próxima com Lula, Lewandowski relata uma série de processos que interessam ao governo.

Na lista estão a ação que trata do fatiamento de estatais com o intuito de privatizá-las, sem a necessidade de aval do Congresso, e o processo relacionado à operação Spoofing, por onde passa anulações de condenações de Lula. Na pauta econômica, há o caso em que o STF decidirá se PIS e Cofins podem ser exigidos sobre as receitas das instituições financeiras.

Dada a relação que cultivou com Lula, Lewandowski deverá ser consultado sobre o melhor nome para substitui-lo. O ministro trabalha pela escolha de Manoel Carlos de Almeida Neto, que atuou como secretário-geral da Corte durante a presidência do ministro, entre 2016 e 2018, e foi seu chefe de gabinete.

Manoel Carlos, de 43 anos, conta com outro respaldo importante, o de integrantes do Prerrogativas, grupo de juristas que exerce influência na área jurídica do governo. Nas últimas semanas, o advogado intensificou a articulação para ficar com a cadeira. 

Ele e Lewandowski têm circulado juntos em Brasília, como num evento gastronômico que ocorreu após o lançamento de um livro organizado pelo ministro Gilmar Mendes, na biblioteca do STF, no início deste mês. Por outro lado, sua atuação como chefe jurídico da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) virou munição para adversários na corrida, que nos bastidores apontam possível conflito de interesses em ações relacionadas à companhia no Supremo.

Efeito colateral

Já Cristiano Zanin não precisa de intermediários para chegar ao responsável pela nomeação. Ele representa Lula nas ações penais a que o petista responde. Ganhou prestígio por ter conseguido a libertação do presidente, que passou 580 dias preso, a anulação de suas condenações e o reconhecimento de suspeição do ex-juiz Sergio Moro nos processos. 

Assim como o seu principal concorrente, Zanin passou a estar mais presente em rodas de políticos e integrantes do Judiciário influentes. Ele também compareceu ao lançamento do livro organizado por Gilmar neste mês.

O fato de ser o nome mais próximo a Lula, contudo, pode gerar um efeito reverso a suas pretensões. Aliados têm alertado o presidente sobre o risco de o Senado usar a eventual indicação de Zanin para atingir o presidente ou para ampliar a barganha nas negociações com o Planalto por cargos. 

Esses conselheiros lembram ao petista o que ocorreu com o hoje ministro do STF André Mendonça. A indicação dele levou cerca de cinco meses para ser votada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), pois Mendonça era visto como uma espécie de representação do então presidente Jair Bolsonaro.

Até agora, Lula tem procurado se manter distante do cabo de guerra dos bastidores. Interlocutores do presidente afirmam que, à essa altura, ele evita emitir sinais sobre um eventual preferido. A uma pessoa de confiança, o petista disse apenas que não poderá errar na escolha.

Aliados defendem que, em sua primeira indicação ao Supremo, Lula recorra a um magistrado com experiência em tribunais superiores. Caso opte por um membro do STJ, avaliam, o efeito cascata lhe permitiria alçar mais um jurista à vaga que seria aberta no Superior Tribunal de Justiça. O presidente vem sendo aconselhado a dar prioridade a um perfil jovem, de até 50 anos, com quem poderia contar, teoricamente, por um longo período na Supremo.

Ministros no páreo

Para além dos dois candidatos que advogam, o presidente do TCU, Bruno Dantas, tem a seu favor um passado de atuação no Senado, onde tramitam as indicações para o STF. Antes de ir para a Corte de Contas, ele foi consultor-geral da Casa de 2007 a 2011. 

Nesse período, criou pontes com a classe política, principalmente com caciques do MDB no Senado, como o senador Renan Calheiros (AL) e o ex-presidente José Sarney. Além disso, a escolha dele contaria com a aprovação de Gilmar Mendes, um dos mais influentes magistrados do STF. Dantas tem 44 anos e, pela lei atual, poderia permanecer no Supremo por mais três décadas.

Outro nome que tem o respaldo de Gilmar é o do ministro do STJ Mauro Campbell. Assim como o magistrado do Supremo, ele fez a carreira no Ministério Público e é considerado por interlocutores da Corte um personagem com articulação política, perfil que se assemelha ao de Lewandowski.

Entre os quadros do Supremo, Alexandre de Moraes também divide a sua preferência entre mais de um postulante à vaga. São eles os ministros do STJ Benedito Gonçalves e Luís Felipe Salomão, dois magistrados com quem atuou no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ambos demonstraram afinamento com Moraes em temas sensíveis analisados pela Corte eleitoral durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, que fazia reiterados ataques ao TSE e ao STF.

Embora tenha conquistado o apreço do entorno de Lula por sua atuação no TSE, além de ser o único ministro negro do STJ, Benedito Gonçalves, de 69 anos, tem contra si o fator idade. Interlocutores do presidente pontuam que não valeria “gastar essa ficha” nomeando um magistrado que poderia ficar apenas seis anos na Corte. O mesmo aspecto, em menor grau, também não favorece Salomão, que vai completar 60 anos no mês que vem.

Apesar de não apareceram entre os mais cotados, outros integrantes do mundo jurídico são citados por petistas como uma possível escolha de Lula, como os advogados Pierpaolo Bottini, Pedro Serrano e Heleno Torres.

OS MAIS COTADOS

Advogados

Manoel Carlos de Almeida Neto


De perfil garantista, foi secretário-geral do Supremo e do TSE, além de assessor do ministro Ricardo Lewandowski e, por isso, conhece o funcionamento da Corte. É considerado discreto e equilibrado, com bom trânsito político. Sua atuação como chefe do jurídico da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) é vista como possível fator de conflito de interesses. Conta com o apoio de integrantes do grupo Prerrogativas, que tem influência sobre a área jurídica do governo.

Cristiano Zanin

Também de perfil garantista, tem a seu favor o trabalho exitoso na defesa do presidente, que culminou com a anulação de decisões contra Lula, o reconhecimento da suspeição de Sergio Moro para julgá-lo e o restabelecimento dos direitos políticos do petista. O carimbo de "advogado de Lula" é visto como problemático por aliados do presidente. Sua recente atuação no caso Americanas, que chegou ao STF, também tem sido apontada como negativa para a indicação dele. Tem o apoio do núcleo duro do PT.

Ministros do STJ

Benedito Gonçalves

É ministro do STJ desde 2008, nomeado por Lula. Sua atuação recente como corregedor-geral da Justiça Eleitoral durante o pleito de 2022 chamou a atenção de interlocutores de Lula. A idade de 69 anos pesa desfavoravelmente para o magistrado, que teria apenas cinco anos para atuar como ministro do STF. A Corte tem aposentadoria compulsória aos 75 anos. Conta com a simpatia do ministro Alexandre de Moraes, do STF, e de integrantes de alas do PT.

Luís Felipe Salomão

Também foi nomeado por Lula para o STJ em 2008. Sua atuação recente como corregedor-geral da Justiça Eleitoral em processos envolvendo fake news foi elogiada por pessoas no entorno de Lula, assim como as ações no Conselho Nacional de Justiça contra abusos de magistrados nas redes sociais.

Completará 60 anos no mês que vem, o que é visto por aliados de Lula como um ponto negativo. Interlocutores do presidente defendem a indicação de alguém com menos de 50 anos. O ministro Alexandre de Moraes é um dos principais entusiastas de sua indicação. Eles se aproximaram durante o período em que atuaram como ministros no TSE.

Mauro Campbell Marques

Foi nomeado ministro do STJ, por Lula, em 2008. Conta com o respaldo de integrantes das Cortes superiores e de ministros do Supremo, como Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, com quem atuou no TSE à frente da corregedoria-geral. Oriundo do Ministério Público, o amazonense de 59 anos é discreto, mas mantém bolas relações na classe política.

Ministro do TCU

Bruno Dantas


Presidente do Tribunal de Contas da União, está na Corte desde 2014. Aos 44 anos, é jovem e tem perfil garantista, duas características que agradam ao Planalto. Foi consultor-geral da Senado durante a presidência de Jose Sarney e, desde então, mantém forte interlocução com a Casa, a quem cabe apreciar a indicação ao STF. Sua ligação com caciques do MDB, contudo, pode gerar desconfianças entre integrantes dos três Poderes.


Fonte: O GLOBO