Aliados do presidente Lula que vão concorrer nas eleições deste ano tentam ajustar o discurso para escapar de críticas

Pressionados pelo uso que a oposição faz do debate sobre segurança pública, aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que vão concorrer nas eleições municipais tentam ajustar o discurso para escapar de críticas e passaram a contar com uma cartilha do PT sobre o tema. O objetivo é enfrentar a ofensiva de adversários do Palácio do Planalto, que utilizam índices de violência para desgastar os governistas e acusam a esquerda de ser complacente com criminosos.

A direção nacional encarregou Abdael Ambruster, que fez carreira como policial penal, de elaborar as orientações para os candidatos petistas em 2024. Entre as sugestões do documento estão armar as guardas municipais, ideia frequentemente apoiada pela direita; reforçar a proteção às escolas; e orientar a guarda civil para ajudar na aplicação da Lei da Maria da Penha, que combate a violência contra a mulher.

O texto diz que “é o prefeito ou a prefeita quem deve estabelecer se a guarda civil municipal será armada ou não” e ressalta que, “por ser uma instituição civil”, não é “indicado que os seus gestores sejam militares”.

Troca de farpas

Em um aceno para a esquerda, o partido também diz que as guardas têm papel estratégico na proteção de mulheres cisgênero (cuja a identidade de gênero é correspondente ao sexo biológico) e trans com medidas protetivas. Segundo Abdael, também será pedido aos candidatos que apoiem a inclusão da guarda civil no rol dos órgãos de segurança pública. Há uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nesse sentido relatada pela deputada Delegada Adriana Accorsi, pré-candidata do PT à prefeitura de Goiânia.

O coordenador de segurança do PT diz ainda que há um alinhamento maior com os governadores Elmano de Freitas (CE) e Rafael Fonteles (PI) e um diálogo que ainda precisa ser “melhorado” com os governadores Jerônimo Rodrigues (BA) e Fátima Bezerra (RN).

Além das orientações formais, os pré-candidatos do Planalto tentam adaptar seus discursos para dar mais espaço à segurança pública.

Em São Paulo, o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), apoiado pelo PT, tem na equipe o sociólogo Benedito Mariano, ex-ouvidor da Polícia Militar (PM) de São Paulo. O pré-candidato tenta fugir da pecha de não ter uma atuação firme na área e disse, em nota, que vem fazendo um “mapeamento de políticas que têm apresentado bons resultados”. “Não queremos nem podemos viver sob o medo”, completou Boulos, ressaltado uma pesquisa Datafolha divulgada em março mostrando que um terço dos paulistanos já teve o celular roubado.

O prefeito Ricardo Nunes (MDB), que concorrerá à reeleição, diz que o adversário “não tem moral para falar de segurança” por já ter defendido a desmilitarização da Polícia Militar e a descriminalização de drogas.

Em Fortaleza, o pré-candidato do PT é o presidente da Assembleia Legislativa, Evandro Leitão. Um de seus principais cabos eleitorais, o governador Elmano de Freitas, que defendeu ao GLOBO a recriação de um ministério para a área, trocou o comando da Secretaria de Segurança Pública e nomeou o delegado Roberto Sá, que já ocupou posto equivalente no Rio. Na posse, Elmano disse que “bandido no Ceará será tratado como bandido que aterroriza nosso povo” e que será “implacável contra o crime”.

Adversário do PT, o prefeito José Sarto (PDT) critica a atuação do governo do estado e deixa claro que levará o tema ao palanque:

— Quem deveria cuidar da segurança das nossas famílias é incapaz de cumprir o seu papel. Depois de refletir muito, vamos armar a Guarda Municipal da nossa cidade. Se o governo do estado não for capaz de fazer o mínimo, a prefeitura de Fortaleza vai fazer o máximo contra a violência.

Evandro Leitão retrucou:

— Agora (Sarto) ainda aparece, de forma oportunista e com discurso demagogo, prometendo resolver a questão da segurança, quando não deu qualquer contribuição em três anos e meio.

Munição para a oposição

Já em Salvador, o pré-candidato apoiado pelo PT é o vice-governador Geraldo Júnior (MDB). Ele é companheiro de gestão do governador Jerônimo Rodrigues (PT), que sofre críticas por conta da segurança.

Os dados de mortes violentas em 2023 aponta a Bahia como o estado com o maior número absoluto, com 4.848, e a quinta maior taxa por cem mil habitantes (34,3), de acordo com o Monitor da Violência, do portal g1. Os dados levam em conta homicídios dolosos (incluindo feminicídios), latrocínios (roubos seguidos de morte) e lesões corporais seguidas de morte.

Os resultados têm servido de munição para o prefeito Bruno Reis (União Brasil), que concorrerá à reeleição. Em março, o vice-governador disse que “o enfrentamento do crime organizado vai continuar com pulso firme”. Como reação, o governo baiano aprovou o programa “Bahia Pela Paz”, que prevê investimentos de R$ 300 milhões na área.

Da mesma forma, a deputada Natália Bonavides (PT-RN), pré-candidata em Natal, divulgou um vídeo no ano passado após receber uma medalha da PM do Rio Grande do Norte, o que foi criticado por parcela dos agentes de segurança:

— Nos últimos dias talvez você tenha ouvido que eu não me importo com o tema da segurança pública. Talvez quem esteja espalhando essas coisas não ache importante os recursos que destinamos para a compra de aparelhos para o Hospital da Polícia Militar, coletes à prova de balas, óculos de visão noturna e outros equipamentos.

Em Goiânia, a deputada federal Delegada Adriana Accorsi tem o tema como um dos focos de sua pré-candidatura. Em março, ela tirou foto ao lado de policiais civis e anunciou que destinou emendas para a categoria.

Por outro lado, os pré-candidatos Sandro Mabel (União), apoiado pelo governador Ronaldo Caiado, e Gustavo Gayer (PL), nome do ex-presidente Jair Bolsonaro, têm explorado um discurso mais punitivista, que não é endossado pela petista.

O mix entre o debate do tema e o quadro eleitoral já provocou reflexos também em votações no Congresso. A deputada Maria do Rosário (PT), pré-candidata em Porto Alegre e conhecida por defender pautas relacionadas à ressocialização de condenados, contrariou o veto de Lula às restrições à saidinha de presos. Após votar contra o governo, ela argumentou que tomou o posicionamento para evitar “ataques da extrema direita”.


Fonte: O GLOBO