Governo de São Paulo tem estimado uma economia de R$ 15 bilhões a R$ 20 bilhões anuais, números que não constam do decreto publicado no último dia 22

Anunciado na semana passada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), o plano de corte de gastos e de reorganização da administração pública extinguiu mais de um terço dos benefícios tributários concedidos pelo estado que estavam próximos do vencimento. O programa consta de um decreto publicado no último dia 22, mas segundo o secretário de Fazenda, Samuel Kinoshita, o processo já está em curso há alguns meses.

Ainda não está claro quanto espaço será possível abrir no orçamento. O governo tem estimado uma economia de R$ 15 bilhões a R$ 20 bilhões anuais, números que não constam do decreto.

Os cortes do governador — Foto: Editoria de Arte


No último mês, a Fazenda estadual reavaliou 64 isenções e reduções na alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) que venciam em 30 de abril. Com a análise, o governo decidiu não renovar o benefício fiscal para 23 itens. Entre eles, estão o fim das isenções para o transporte interestadual de equipamentos didáticos, científicos e médico-hospitalares que se destinassem ao Ministério da Educação; além de produtos como bulbo de cebola; moluscos resfriados ou congelados; preservativos; e pós-larva de camarão, por exemplo.


Segundo Kinoshita, alguns benefícios tributários foram estendidos até dezembro, enquanto outros ganharam prazo maior, até abril de 2026. Foram prorrogados descontos e isenções para setores como equipamentos e insumos utilizados em cirurgias, importação de produtos hospitalares e de produtos destinados à implantação de projeto de saneamento básico.


— Existe um estoque muito elevado de benefícios em nosso país, por isso acho que esse movimento que estamos fazendo já é histórico. Existe um plano de abarcar, ao longo deste ano, uma grande revisão desses benefícios tributários — disse à GloboNews



Questionado se a decisão do governo paulista seria um contraponto ao governo federal, em meio a críticas pelo aumento nos gastos públicos, Kinoshita negou.


— O intuito não é gerar nenhum tipo de confronto com o governo federal. A reavaliação dos gastos ajuda o nosso país como um todo. Não vejo isso como confronto nacional, acho que pauta bem o debate — afirmou.
Benefícios tributários já revistos — Foto: Editoria de Arte




Espaço no orçamento




O plano de Tarcísio, intitulado “São Paulo na Direção Certa”, é visto com bons olhos por especialistas. Publicado no Diário Oficial do Estado na última quinta-feira, o decreto 68.538 se divide em três segmentos: “expansão de investimentos”, “redução de despesas” e “modernização da administração”.


O economista Murilo Viana, consultor em finanças públicas, afirma que a diretriz do programa é “correta”, mas é preciso avaliar como se dará na prática.


— A avaliação de benefícios fiscais deveria ser uma regra contínua, eu vejo isso como algo positivo. A regra no Brasil é a concessão de inúmeros benefícios fiscais de forma pouco transparente, inclusive em relação ao valor total renunciado. A Reforma Tributária, que vai acabar com o ISS e ICMS, tem justamente essa ideia de por fim a essa sistemática de benefícios fiscais como acontece hoje, em que cada estado tem benefícios e regras diferentes, e há pouco acompanhamento de efetividade dos benefícios. Mas isso terá que ser feito com cuidado pela Fazenda.



Em sua visão, é preciso que o estado avalie quais isenções e descontos trazem ou não benefício à sociedade e à economia, mas de uma maneira que não afaste as empresas de investir no estado. Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos e ex-secretário da Fazenda de São Paulo, diz que o programa é “bastante positivo”.





— A responsabilidade fiscal é uma tarefa permanente. Entendo que a avaliação e contenção de gastos e renúncias tributárias é fundamental nesse processo. Não é fácil, porque requer escrutínio detalhado — diz. — Benefício tributário não é necessariamente ruim, sobretudo porque estamos em meio a uma ferrenha guerra fiscal entre os Estados. Neste caso, a avaliação, monitoramento e escrutínio constantes são as ferramentas para controlar, cortar e garantir o que é essencial, separando joio do trigo.




Detalhes do programa




Além da revisão dos benefícios fiscais, o plano de Tarcísio é diminuir gastos com a administração pública e aumentar investimentos. Para isso, ele pretende fazer um “sistema de avaliação de gastos” que vai avaliar se as despesas do governo contribuem para as políticas públicas propostas pela gestão, a quantidade de pessoas beneficiadas, e como impactam na execução de outros programas.


O documento sugere direta ou indiretamente ações como remanejamento de pessoal, corte de benefícios fiscais, fechamento de órgãos públicos. Na última sexta-feira, uma secretaria de governo já foi extinta, a de Negócios Internacionais. O decreto prevê que em 90 dias cada secretaria ou órgão independente do estado apresente seu próprio plano de corte de gastos.


Outra proposta do programa é dar independência às agências reguladoras. Hoje, São Paulo tem duas: a Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) e a Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (Arsesp). Segundo o decreto, esses órgãos terão “autonomia e independência de gestão”.



O governo ainda prevê vender seus imóveis que estejam ociosos e a criação de uma “central de compras”, que deve concentrar processos de aquisição de material e contratação de serviços. Outro objetivo é uma análise aprofundada sobre todos os órgãos que há na administração pública atualmente: o governo pretende extinguir setores e entidades que não considere essenciais e reorganizar funcionários.


Para Adriano Gomes, consultor da Méthode Consultoria, o plano é “uma revisão de ponta a ponta buscando eficiência, economia e perenidade da organização”. Já Viana acredita que o plano “tem um viés de maior eficiência para viabilizar maior investimento público”, mas é preciso cautela na hora de extinguir órgãos públicos.


— A diretriz de buscar maior eficiência de gastos, redução de despesas correntes, e ter um sistema de avaliação de qualidade de gasto está em linha com as diretrizes internacionais, que seria o que, no âmbito federal tanto se discute que é o spending review, a revisão periódica das despesas.


Outro ponto sob a rubrica de redução de despesa é um novo acordo de renegociação da dívida com a União, que hoje está sendo reindexada a 4% ao ano acima do IPCA. Tarcísio disse em discurso que espera convencer a União a baixar o valor para 2%. O governador afirmou em discurso que só essa medida abriria R$ 4 bilhões de espaço por ano no orçamento. (Com Rafael Garcia)




Fonte: O GLOBO