Pressão ocorre após encontro do petista com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, no domingo

Preocupado com a crise entre governo e Congresso e a fragilidade da articulação política, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez novas cobranças aos ministros para reforçar o diálogo com o Legislativo. Em solenidade no Palácio do Planalto, Lula citou auxiliares com maior destaque na Esplanada para passar o recado de que é preciso insistir na aproximação. 

O petista chegou a dizer que o titular da Fazenda, Fernando Haddad, deveria abdicar de leituras para estar mais perto de parlamentares. O pito ocorre em um momento em que o modelo da interlocução entre os dois Poderes, liderada por Alexandre Padilha (Secretaria de Assuntos Institucionais), é atacada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), além de ser criticada internamente, até mesmo pelas bancadas do PT.

O gesto de Lula também acontece um dia depois de ele ter encontrado Lira no Palácio da Alvorada, com o objetivo de debater a relação. Desde a semana passada, a equipe econômica tenta desarmar a tramitação das chamadas “pautas-bomba”, que elevam as despesas do orçamento, enquanto o próprio Lula passou a mobilizar a base e auxiliares para evitar derrotas. Amanhã, por exemplo, o Congresso deve apreciar vetos sensíveis aos interesses do governo, com possibilidade real de derrotas.

Recado em público

Em seu discurso, além de citar Haddad, o presidente mencionou o vice-presidente e ministro da Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin; o chefe da Casa Cilvil, Rui Costa; e o ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias.

— O Alckmin tem que ser mais ágil, tem que conversar mais. O Haddad, ao invés de ler um livro, tem que perder algumas horas conversando no Senado e na Câmara. O Wellington, o Rui Costa, passar maior parte do tempo conversando com bancada A, com bancada B — declarou Lula.

Considerado “desafeto pessoal” e “incompetente” por Lira, Padilha não foi citado pelo presidente, o que reforça a posição pessoal de Lula em não ceder às pressões do presidente da Câmara. Segundo auxiliares do presidente, porém, o movimento pode ser interpretado como uma cobrança a todos os ministros, inclusive de partidos aliados.

Há a percepção de que os indicados de União Brasil, PSD e MDB , cada qual com três ministros, não entregam tudo o que poderiam. De acordo com Lula, os desafios de articulação incluem “fazer política”. Na segunda-feira, Haddad respondeu ao comentário de Lula ao ser questionado pela imprensa.

— Eu só o que faço isso da vida — disse Haddad.

Ministros que despacham diariamente com Lula afirmam que essa é a uma manifestação típica do estilo do presidente, quando quer mandar recados aos seus subordinados. Lula critica ministro, querendo passar recado a outros. Auxiliares tentaram minimizar a crítica de Lula feita a Haddad.

Em um grupo de WhatsApp com ministros da base aliada, Padilha envia semanalmente a pauta prioritária do governo no Congresso e pede empenho pessoal dos colegas em mobilizar suas bancadas nas votações.

Há expectativa que Lula se reúna agora com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Lira já havia rompido o diálogo com Padilha no fim do ano passado. Desde então, as conversas com o presidente da Câmara têm sido feitas com Rui Costa, e com o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE).

O governo vem enfrentando batalhas no Congresso para aprovar medidas de aumento de arrecadação ou para barrar projetos que têm forte impacto no caixa da União. O mais recente revés foi a aprovação na Comissão de Constituição e Justiça do Senado de Projeto de Emenda à Constituição que estabelece aumento de 5% nos vencimentos de juízes e promotores, a cada cinco anos, o chamado “quinquênio”. O impacto pode chegar a R$ 42 bilhões por ano.

Pressão por emendas

Na reunião de sexta-feira com líderes, que durou quase três horas, Lula foi informado que há grande chance de que o governo sofra novas derrotas no Congresso durante a semana. A expectativa dos parlamentares é que o corte de R$ 5,5 bilhões das emendas de comissão e o veto ao trecho da Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO) que estabelecia um cronograma para o pagamento de emendas sejam derrubados. Há uma avaliação ainda que o veto de Lula ao trecho da lei que limita a “saidinha de presos” também será derrubado.

Na segunda-feira, o governo teve uma deserção na Câmara. O deputado Dr. Victor Linhalis (Podemos-ES) renunciou ao posto de vice-líder após declarar divergências em relação “à pauta da segurança jurídica no campo”, matéria da qual é relator. Ele se manifestou de forma contrária à vontade de petistas na Casa.

Já o ex-ministro José Dirceu, em evento em São Paulo, disse que Lula montou um governo de centro-direita. Horas depois, entretanto, corrigiu-se dizendo que o governo é de centro-esquerda, com apoio da centro-direita.

— O presidente Lula não só foi eleito nestas condições, como montou um governo que não é de centro-esquerda não, é um governo de centro-direita — disse Dirceu.

(Colaborou Hyndara Freitas)


Fonte: O GLOBO