Experimento global que já passou pela Europa e América do Norte chegou ao Brasil. Entenda as razões que levaram negócios de diferentes setores a aderirem ao projeto

Escritório de advocacia, estúdio de arquitetura, consultoria e até hospital. A área de atuação das empresas brasileiras que decidiram reduzir a jornada de trabalho de seus funcionários de cinco para quatro dias é diversa. No Brasil, o experimento que já passou por vários países está sendo conduzido pela 4 Day Week em parceria com a Reconnect Happiness at Work.

Na próxima segunda-feira, as primeiras quinze empresas selecionadas para o projeto participarão do primeiro encontro do piloto. Nos próximos três meses será feita a consultoria e mentoria para que cada uma defina a melhor estratégia para adotar a semana reduzida. A partir de dezembro, a semana de quatro dias começa efetivamente a ser implementada.

Ganho de produtividade, atração de talentos, melhora do engajamento dos funcionários, índices maiores de satisfação, projetos com mais qualidade e busca por pioneirismo no modelo de trabalho são algumas das motivações dos empresários que estão participando do projeto.

'Mais rendimento nas vendas'

Com a 4 Day Week, cada um irá definir as estratégias para implementar a jornada mais curta. O foco é que o projeto define como 100-80-100: salário 100% mantido, em 80% do tempo de trabalho, com 100% de produtividade.

— Ainda não definimos como será a nossa divisão — conta Jorge Pacheco Seabra, diretor da Brasil dos Parafusos, especializada no setor de fixação. — Estamos analisando o melhor formato. Gostaríamos que todos os envolvidos saíssem ganhando.

O empresário conta que, com a jornada reduzida, ele espera garantir mais tempo livre para os colaboradores. Como consequência de um ganho na saúde mental dos funcionários, Seabra acredita que haverá um rendimento maior nas vendas e na produção da empresa. É uma oportunidade para analisar o que de fato é que traz mais benefícios para a empresa, diz Seabra.

'É uma mudança cultural na empresa'

Fabrício Oliveira, CEO da Vockan — Foto: Divulgação/Vockan

Para Fabrício Oliveira, CEO da empresa de tecnologia Vockan, a semana de quatro dias traz retorno para a empresa em diferentes frentes, ao endereçar questões de saúde mental dos funcionários, ajudar na retenção e atração de talentos, aumentar a produtividade e deixar a empresa alinhada com as principais tendências do futuro do trabalho.

Entre as empresas que participam do piloto, a Vockan é a mais experiente no tema. A empresa de cem funcionários participou do piloto da 4 Day Week rodado em Portugal, em novembro do ano passado. O executivo conta que, agora, entrou no experimento brasileiro para aperfeiçoar a metodologia que já começou a aplicar.

— É uma mudança cultural na empresa. Para a gente é importante manter essa relação com a organização para que o modelo seja sustentável e tenha continuidade — completa o executivo.

Os resultados, segundo ele, já aparecem. O monitoramento interno mostra que o turnover (taxa de rotatividade dos funcionários) foi reduzido em 100% no período. O grau de felicidade dos colaboradores, medido pelo projeto, aumentou em 43%, enquanto a produtividade da empresa subiu 23%.

No caso da Vockan, um dos maiores fatores que levava à perda de produtividade dos funcionários eram as reuniões, que acabaram limitadas na empresa e passaram a ter um padrão de trinta minutos. Mas, para cada negócio, o experimento trabalha para identificar gargalos de produção e aperfeiçoar processos.

'Queremos um novo jeito de trabalhar'

Andrea Janér, CEO da Oxygen: programa é ''um treinamento para a gente aprender um novo jeito de trabalhar'' — Foto: Divulgação/Oxygen

Para a consultoria de inovação Oxygen, o intuito de entrar no projeto, além de buscar ganhos operacionais e atração de talentos, tem a ver também com sair na frente em uma mudança que, para a CEO da empresa, será profunda e estrutural na forma como o mundo do trabalho se consolidou.

Andrea Janér diz que o projeto tem a vantagem de ajudar os negócios a desenhar uma nova forma de relação com o tempo. Ela lembra que o experimento não oferece "receita de bolo", mas um método para que cada empresa possa adotar o sistema.

— O que o programa piloto deles oferece é justamente um treinamento para a gente aprender um novo jeito de trabalhar. Não é apenas tirar uma sexta-feira da semana. Eu confio no que a 4 Day Week faz porque eles já têm uma experiência e metodologia para isso — explica a CEO.

Como um negócio de pequeno porte, de menos de 15 funcionários, a Oxygen vê outro motivo em adotar o sistema: ter um diferencial competitivo, em relação a grandes empresas, para poder atrair profissionais qualificados. Esse é um benefício que "muita gente vai valorizar", diz.

'A advocacia é conhecida por não prezar pelo bem-estar'

Soraya Clementino, sócia da Clementino & Teixeira Advocacia — Foto: Reprodução Linkedin

Soraya Clementino, sócia do Clementino e Teixeira Advocacia, conta que desde o anúncio de que o escritório estava no projeto, os currículos já começaram a chegar, com pessoas interessadas em trabalhar no local. Alguns entraram em contato "por brincadeira", diz ela, mas outros realmente demonstraram interesse em uma contratação.

— A advocacia é uma carreira conhecida por não prezar pelo bem-estar. São ambientes opressores. É um ponto sensível na área. Estamos tentando contribuir para a melhora do ambiente no nosso escritório e até virar modelo para a área.


Fonte: O GLOBO