Departamento de Vigilância em Saúde do Acre diz que números estão dentro do esperado, mas que estado se prepara, caso precise tomar medidas futuramente.

O Departamento de Vigilância em Saúde do Acre informou que o decreto de emergência publicado na terça-feira (19) em decorrência da baixa qualidade do ar, fumaça e estiagem no estado, foi uma medida preventiva para uma resposta futura, caso necessário.

Apesar de no decreto afirmar superlotação das unidades de saúde, os números de atendimento nas unidades, segundo a Saúde, estão dentro do esperado para o período conhecido na região como "verão amazônico", quando o estado enfrenta seca, altas temperaturas, baixa umidade do ar e poluição acima do recomendado devido à incidência de queimadas.

A pedido do g1, a Secretaria de Saúde do Acre informou como está a ocupação dos leitos de UTI nas unidades de Rio Branco. Os leitos incluem todos os tipos de enfermidade e não apenas aqueles internados por síndromes respiratórias, pois não há essa divisão. Confira:


UTI Fundação Hospitalar (10 leitos)

Setembro: 95,50%

UTI Huerb (27 leitos)

Setembro: 95,13%

UTI Pediátrica (20 leitos)

Setembro: 48,9%

Edvan Meneses, chefe do Departamento de Vigilância em Saúde do Acre, explica que, na verdade, o governo se antecipou para tomada de decisões futuramente.

"O decreto é um ato normativo, que orienta as ações de vigilância e da rede de atenção. O que a Secretaria de Saúde hoje deseja é que nós possamos, a partir desse ato normativo, organizar rede de atenção à saúde, os nossos leitos, insumos estratégicos, organizar nossas ações para responder a essas pessoas que vão procurar a unidade de saúde por problemas respiratórios causados pela má qualidade do ar, pela temperatura que está alta, pelo nível do rio em período de estiagem, porque envolve todos esses determinantes”, destaca.


Janaira Souza da Costa Araújo, autônoma, levou a filha de 6 anos para uma consulta médica — Foto: Murilo Lima/Rede Amazônica Acre

Janaira Souza da Costa Araújo, autônoma, levou a filha de 6 anos para uma consulta médica. Segundo ela, a menina chegou a ter 39 graus de febre e não passou com medicação.

“Como está tendo muitas crises de síndrome respiratória, trouxe ela para prevenir até não só a crise, mas também a pneumonia, que está dando muito tanto no adulto quanto nas crianças. Fumaça prejudica muito com esse tempo seco, tem muitas queimadas, e isso prejudica muita saúde das crianças e dos adultos também”, disse.

A mãe conta ainda que a filha já ficou internado um mês com princípio de pneumonia. “A bronquite asmática daquela atacou por conta desse tempo e devido à fumaça."


Aumento de atendimento já era esperado, segundo a Saúde — Foto: Murilo Lima/Rede Amazônica Acre

'Momento de preparação'

Apesar do alto número de atendimentos nas unidades de saúde, ele explica que esse é um comportamento esperado para esse período do ano no estado.

“Nós temos hoje um número estável. Apesar do aumento no número de julho e agosto, que já é esperado, nós trabalhamos com sazonalidade, então todos os anos nós aguardamos que nesse período tenhamos um tempo mais seco, a qualidade do ar esteja menor, temperaturas elevadas, então é um cenário que já esperamos e, como resposta, nós lançamos o decreto para que nós possamos organizar nossas ações, então está sendo um momento de preparação, de resposta para que a gente não chegue a colapsar, que é o que a gente não quer. É uma preparação."

O chefe da divisão então voltou a afirmar que o decreto é apenas para ter respaldo jurídico, caso medidas precisem se tomadas futuramente.

"A gente vai respondendo conforme a demanda, então nós enquanto vigilância, vamos passando as informações, como percebemos esse discreto aumento, como temos um cenário que pode piorar, fizemos esse decreto que vai ajudar. O caminhar da secretaria é a gente se resguardar, ter nosso decreto para que, se necessário, ter respaldo jurídico”, destaca.

Decreto

O governador do Acre, Gladson Cameli, decretou emergência no estado alegando superlotação das unidades estaduais de saúde, causada pela situação da má qualidade do ar. O resultado é devido às queimadas que geram fumaça e acabam impactando a saúde da população. O decreto foi publicado na manhã de terça-feira (19) e tem prazo de 90 dias.

"Os dados da série histórica sobre a concentração do material particulado, até julho de 2023, revelam uma tendência de aumento na concentração (média diária MP2,5/µg/m3) entre os meses de agosto a outubro, podendo aumentar também nos meses de novembro e dezembro em decorrência do “El Niño”, ultrapassando as médias de limites preconizados pela Organização Mundial de Saúde (OMS)", destaca o documento.

Para o Jornal do Acre 1ª Edição, o secretário de Saúde do estado, Pedro Pascoal, disse que muitos grupos estão sendo afetados com a baixa qualidade do ar e, por isso, os atendimentos nas unidades de saúde têm se intensificado.

“Mais uma vez friso que essa ação é estratégica, que tem como integração o Ministério da Saúde como retaguarda e orientador. Assim como nós passamos no início do ano síndrome respiratória aguda grave por conta do vírus sincicial respiratório e o vírus influenza, nós estamos agora enfrentando a mesma situação, com um público diferente, sabemos que agora a população que é acometida pelas queimadas, pela qualidade ruim do ar, é de idosos e pacientes crônicos.

Então, nós precisaríamos de uma estratégia de fortalecimento. Essa ação visa um fortalecimento financeiro, um subsídio do Ministério da Saúde para que nós consigamos de fato abrir novos leitos e manter aqueles que já estão abertos estruturados.

Assim como fortalecimento das nossas portas, das nossas unidades, para que a gente consiga vencer essa etapa, assim como nós vencemos o assim no respiratório aguda grave voltado para a pediatria. Então essa foi uma estratégia articulada do Ministério da Saúde, para que nós consigamos passar essa etapa de forma tranquila sem que nós tenhamos grandes perdas", destacou.

Decreto por queimadas

Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que o Acre já registrou, de janeiro a 13 de setembro, 3.416 focos de queimadas. Somente nos 18 dias de setembro, foram 1.768 focos. O município de Feijó lidera com total de 414 focos, Tarauacá com 349 focos, Cruzeiro do Sul com 148 focos, Rio Branco com 106 focos, Rodrigues Alves com 97 focos e Sena Madureira com 95 focos.

Em julho, antes mesmo desse cenário piorar, o governo do Acre declarou situação de emergência ambiental em dez cidades do estado.Conforme o decreto, a emergência declarada é válida entre os meses de julho a dezembro de 2023.

O governo também levou em consideração as condições climáticas adversas, tais como estiagens prolongadas, altas temperaturas, ondas de calor, baixa umidade relativa do ar e intensos ventos, que favorecem as ocorrências de incêndios florestais.

Entre as cidades em situação de emergência estão:

Acrelândia
Brasiléia
Bujari
Cruzeiro do Sul
Feijó
Manoel Urbano
Sena Madureira
Tarauacá
Rio Branco
Xapuri


Unidade sentinela para síndromes respiratórias foi instalada na UPA do 2º Distrito há alguns meses — Foto: Odair Leal/Secom

Unidade sentinela

Em junho deste ano, o estado também decretou emergência devido de surto de Síndrome Gripal e Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG). Na mesma época, com mais de 150 mortes, uma unidade sentinela foi montada para monitorar os casos e funciona na UPA do 2º Distrito, em Rio Branco. Essa é a unidade de referência na capital.

Adalo Lima, gerente de assistência dessa unidade, explica que o aumento dos casos é perceptível, mas que em junho a crise foi mais grave. Segundo ele, a unidade, em agosto, fez 16mil atendimentos e destes 9 mil foram relacionados a síndromes respiratórias.

"Hoje por exemplo, nós estamos atendendo uma média de 500 a 550 pacientes por dia na nossa unidade e aí esse número cresceu bastante, muito em virtude do tempo.

A gente percebe que o clima está muito associado a essa situação porque a maior parte dos pacientes que nos procura é aqueles com problemas respiratórios, pacientes que já são asmáticos, que já tem predisposição e aí, quando exposto ao tempo seco e úmido, extremamente quente que estamos vivenciando agora nesse período sazonal, eles acabam agravando e buscando a unidade”, destaca.

Desde o surto das síndromes gripais, em junho deste ano, o gerente disse que não foi possível ver uma redução significativa, porém, destacou que esse cenário é sazonal.

“Tivemos números maiores durante o período de síndromes gipais, porém esse número não baixou significativamente, continuamos tendo casos elevados. Foi necessário, inclusive, criar uma unidade e foi com o apoio da Sesacre, chamada de unidade sentinelas, onde nós atendemos especificamente esse público, que é notificado, monitorado, acompanhado esses pacientes com síndromes gripais", pontua.


UPA do 2º Distrito é referência em atendimentos de síndromes respiratórias — Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre

Os pacientes de nível intermediário devem procurar as UPAs, os casos leves as Uraps e apenas procurar o pronto-socorro em casos graves da doença.

Luana Lima é mãe da Yasmin e procurou a unidade após a filha apresentar cansaço. “Hoje ela estava com dor no peito, muito cansada, aí prejudica a criança no dia a dia. E trouxe ela”, disse. Rosiane Sampaio, mãe do Isaque de apenas 4 meses, também procurou atendimento para o bebê. “Ele está com uma tosse muito forte e aí dificulta respiração e dificulta alimentação porque ele vomita muito”, disse.

A professora Magda da Rocha disse que está se sentindo mal há duas semanas e agora decidiu procurar atendimento porque não melhorava. Ela esteve na UPA da Sobral na manhã desta quinta-feira (21). “Estou sentindo dor de cabeça, dor no ouvido, nos peitos e costas também. Muita dor e muita dificuldade para respirar. Estou sentindo há duas semanas, como piorou procurei atendimento, que está até rápido”, disse.


Queimadas interferem na qualidade do ar em período de estiagem — Foto: Semapi

Poluição do ar

No último dia 9, o número de poluentes encontrados no ar em Rio Branco estava mais de cinco vezes acima do considerado ideal. Conforme os sensores que monitoram a qualidade do ar no Acre, por meio do sistema Purple Air, a capital acreana apresentou, naquele dia, um pico de concentração de 83 microgramas por metro cúbico de material particulado.

Esses equipamentos fazem parte de um projeto entre o Ministério Público do Acre (MP-AC), a Universidade Federal do Acre (Ufac) e órgãos de saúde e do meio ambiente do estado.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) prevê que a quantidade de material particulado por metro cúbico (µg/m³) aceitável é de 15 microgramas. Porém, a partir de 12 µg/m³ já oferece risco em uma exposição prolongada. Até 2021, o valor aceitável era até 25 microgramas, segundo explicou o professor e pesquisador da Ufac, Foster Brown.

Nesta terça-feira (19), foi registrado em Rio Branco 27 microgramas por metro cúbico de material particulado, que é a qualidade do ar é aceitável. No entanto, se expostos por 24 horas ou mais, pode haver um problema de saúde moderado para um número muito pequeno de pessoas

“É um fator agravante. Nós sabemos que a fumaça possui inúmeras substâncias tóxicas, que são nocivas para o aparelho respiratório. A orientação que nós passamos para a população é que evite as queimadas. Aquele lixo que que no final do dia se coloca fogo, por mais que seja mínimo, vamos evitar. Vamos encaminhar para que seja feita a correta coleta pela equipe de saneamento público.

Nós precisamos da colaboração da população nesse momento, porque pode ser um familiar seu que passe mal e necessite assistência médica. Isso está diretamente relacionado. O meio ambiente monitora a qualidade do ar, a Secretaria de Saúde também monitora a qualidade do ar, nós cruzamos os dados e as decisões são tomadas em conjunto. Então fica isso alerta para a população, para que evitem, de fato, as queimadas", pontuou o secretário de Saúde.

Para 2023, a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica do governo dos Estados Unidos (NOAA, na sigla em inglês), a estimativa é que o El Niño tenha uma das ocorrências mais intensas dos últimos 70 anos.

Fonte: G1