Ganhou um apelido curioso a atitude do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de adiar a tramitação do arcabouço fiscal em resposta às reclamações que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de que Câmara a “está com um poder muito grande” e que “não pode usá-lo para humilhar o Executivo e o Senado”.

Interlocutores de Haddad com quem a equipe da coluna conversou chamaram o movimento de tática "me dê motivo" – referência irônica à canção imortalizada por Tim Maia.

Isso porque acham que Lira estava procurando uma desculpa para adiar a votação – e a entrevista de Haddad ao jornalista Reinaldo Azevedo, na última segunda-feira, serviu de álibi para o movimento.

Na avaliação desses aliados, o verdadeiro objetivo de Lira seria fustigar o governo e externar sua insatisfação com a demora na reforma ministerial, desenhada para sacramentar o casamento de Lula com o Centrão e cozida a fogo baixo pelo Planalto há quase dois meses.

De acordo com reportagem da Folha de S. Paulo, Haddad teria feito a declaração a Azevedo por ter ficado irritado com Lira, após uma discussão a respeito da taxação de fundos offshore – o presidente da Câmara é contra, mas o governo quer aprovar o mais rápido possível.

Depois do entrevero, interlocutores de ambos atuaram nos bastidores para selar a paz entre eles. Os dois conversaram por telefone e Haddad deu uma entrevista na porta do ministério da Fazenda para dizer que não fez uma crítica à atual legislatura da Câmara, mas ao que chamou de “fim do presidencialismo de coalizão”.

Nesta terça-feira, Lira tentou colocar um ponto final ao declarar que a Câmara não tinha a intenção de acirrar os ânimos com o governo. Mas àquela altura a tática "me dê motivo" já tinha cumprido sua função.

Além de empurrar para a semana que vem o desfecho do arcabouço, Lira também adiou para a próxima segunda-feira (21) a reunião de líderes da Câmara, técnicos e o relator do projeto, Claudio Cajado (PP-BA), sobre as alterações no texto já realizadas pelo Senado.

Assim como a mudança no xadrez da Esplanada, as negociações pela votação do arcabouço fiscal se arrastam desde julho. O presidente da Câmara tem usado a agenda do plenário como instrumento de negociação por espaços no governo.

Como publicamos no blog na última segunda-feira, Lula pretende entregar uma pasta ao PP de Lira e outra ao Republicanos, partido ligado à Igreja Universal e presidido pelo deputado Marcos Pereira (SP) e deve mexer na cúpula da Caixa Econômica Federal. O problema é que, até agora, o petista tem feito mistério quanto ao desenho final da reforma, que obviamente exigirá mudanças na equipe atual.

Nas conversas que se arrastam desde o início de julho, o que vem sendo combinado é que os deputados federais Silvio Costa Filho (Republicanos-PE) e André Fufuca (PP-MA) devem assumir dois ministérios representando seus partidos.

Até agora, as alternativas de cargos a serem ocupados por essas legendas já passaram pelos ministérios dos Esportes, Desenvolvimento Social, Ciência e Tecnologia e até Portos e Aeroportos, mas não há qualquer definição.

O presidente da República pretende realizar mais uma rodada de conversas com as lideranças dos partidos para oficializar as mudanças. Como publicou O GLOBO nesta quarta-feira (14), há a expectativa de que o presidente da República bata o martelo antes de viajar para a África do Sul no próximo domingo (20) para participar da cúpula dos Brics.


Fonte: O GLOBO