Estatal terá de renegociar termos com o Cade, órgão de defesa da concorrência. Setor privado monitora movimentação da petroleira

A Petrobras vai rever os acordos feitos com o Cade, que regula a concorrência no país, para vender refinarias e ativos de gás natural. 

Os chamados Termos de Compromisso de Cessação (TCCs) foram assinados em 2019, no governo Jair Bolsonaro, pelo então presidente da empresa, Roberto Castello Branco, para estimular a concorrência no mercado nacional de refino e de gás natural. A assinatura dos acordos suspendeu os inquéritos administrativos que apuravam suposto abuso de posição dominante por parte da estatal.

Segundo fontes, Petrobras e Cade já estão em tratativas para um encontro. A estratégia é iniciar nova negociação levando em conta o fim do plano de venda de ativos com o início do governo Lula.

Na segunda-feira, a estatal disse, em comunicado ao mercado, que “buscará construir em conjunto com o Cade uma solução para conciliar os compromissos assumidos anteriormente com as novas propostas a serem consideradas no Planejamento Estratégico”.

Segundo uma fonte, serão apresentados os planos, que incluem ampliação de investimentos em refino e malhas de dutos para escoar o gás oriundo dos campos de petróleo em alto-mar, como no pré-sal. Um especialista lembrou que será essencial que a Petrobras detalhe como será sua política de preços de combustíveis. Desde 2016, ela usa a paridade com o mercado internacional, política conhecida como PPI.

Papel dominante

O próprio Cade também está em fase de mudanças. No segundo semestre, devem ser indicados pelo governo quatro novos conselheiros ao órgão. O Tribunal do Cade conta com seis integrantes e o presidente.

A Abicom, associação dos importadores, acompanha as movimentações. Ela foi uma das responsáveis pela abertura do processo no Cade após questionar o abuso da Petrobras como agente dominante na precificação de combustíveis com valores abaixo da paridade internacional.

— Esperamos que o Cade avalie com seriedade o eventual não cumprimento dos compromissos assumidos pela Petrobras. Dos acordos, o mais importante era desconstruir a condição de agente dominante, com a venda de 50% da capacidade de refino — diz o presidente executivo da Abicom, Sergio Araujo.

Evaristo Pinheiro, representante da Refina Brasil, associação recém-criada que reúne as refinarias de Mataripe (BA), Riograndense (RS), Dax Oil (BA), Ream (AM), SSOil (SP) e Paraná Xisto (PR), afirmou que vai acompanhar as discussões da Petrobras e do Cade:

— A Petrobras tem legitimidade para pleitear uma renegociação caso o cenário mude. A gente vê com naturalidade, mas vamos analisar o que será feito para ver se vamos participar.

Ele, porém, ressalta que, qualquer que seja a renegociação, espera que o Cade leve a Petrobras a adotar uma conduta isonômica entre suas refinarias e as independentes. Hoje, há um inquérito em andamento no Cade que investiga as condições de venda de petróleo pela Petrobras para suas refinarias e para agentes privados do setor.

— Pleiteamos isonomia e transparência nas condições de venda de petróleo da Petrobras para suas refinarias e as empresas independentes. É importante a transparência, para não ter abuso de poder econômico. Isso é benefício para todo o mercado — diz Pinheiro.

No acordo com o Cade sobre refinarias, a estatal havia se comprometido a vender oito unidades, que somavam metade sua capacidade, mas só se desfez de quatro: da Bahia (Rlam), Amazonas (Reman), Paraná (Six) e Ceará (Lubnor). Desde 2020, a estatal vinha negociando ampliação do prazo para se desfazer das outras.

No TCC relativo ao mercado de gás, a estatal chegou a vender a TAG e a NTS, dois dos maiores gasodutos do país, além da Gaspetro, subsidiária dona de concessionárias estaduais de gás no Brasil.

Em dezembro de 2020, a estatal havia lançado o teaser para vender seus 51% de participação na Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil (TBG), que opera o Gasoduto Brasil-Bolívia (Gasbol), mas as negociações não avançaram. Em evento na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) na segunda-feira, Jean Paul Prates, presidente da estatal, disse que a venda do controle da TBG será revista.

Além da TBG, com 2.593 quilômetros de extensão no Brasil em 136 municípios, a estatal tinha lançado oferta para vender seus 25% na Transportadora Sulbrasileira de Gás (TSB). Localizada no Rio Grande do Sul, a TSB tem 50km de dutos já instalados e um projeto de 565km adicionais, que, uma vez instalados, conectarão a TBG ao mercado argentino de gás. O processo de venda não avançou.

O Cade disse que os termos firmados com a Petrobras estão em fase de acompanhamento de decisão, que é realizado pelo Tribunal Administrativo. Destacou que não comenta casos em andamento. A Petrobras não comentou.


Fonte: O GLOBO