Coronel Mauro Cid delegou a funcionário do Planalto a missão de ir ao Aeroporto de Guarulhos buscar a liberação dos diamantes apreendidos pela Receita Federal

O coronel Mauro Cid, homem de confiança e espécie de “faz-tudo” do ex-presidente Jair Bolsonaro durante seu mandato, deixou suas impressões digitais nas ofensivas do governo para tentar a liberação irregular das joias de R$ 16,5 milhões apreendidas pela Receita Federal. O caso foi revelado pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, que mostrou que o conjunto de joias dado pela família real saudita foi encontrado na mochila de um servidor do Ministério de Minas e Energia, no Aeroporto de Guarulhos.

A apreensão das peças que não haviam sido declaradas ao Fisco ocorreu em outubro de 2021. Depois de três tentativas frustradas de reaver as joias, o Planalto tentou uma última cartada em 29 de dezembro de 2022, a dois dias do fim do mandato de Bolsonaro. 

Naquela data, o primeiro-sargento da Marinha Jairo Moreira da Silva, um funcionário da Presidência, foi enviado a Guarulhos em uma viagem de urgência em voo da Força Aérea Brasileira (FAB).

A justificativa que consta no Portal da Transparência diz que o militar faria a viagem “atendendo a demanda recebida do chefe da ajudância de ordens do presidente da República”. O chefe da ajudância de ordens à época era Mauro Cid, que exerceu a função de 14 de dezembro de 2018 até 4 de janeiro deste ano, quando foi exonerado pela gestão Luiz Inácio Lula da Silva.

Ainda de acordo com o registro da viagem feita por Jairo Moreira da Silva, o servidor se deslocaria para Guarulhos “para atender a demandas do senhor presidente da República naquela cidade”.

O envolvimento de Mauro Cid nessa questão traz Bolsonaro para mais perto da polêmica acerca das joias. O coronel é próximo do ex-presidente e chegou a ser apontado como um de seus conselheiros no Planalto — o militar inclusive embarcou com o ex-mandatário para Miami, nos Estados Unidos, onde Bolsonaro permanece até hoje.

Cid já precisou prestar depoimento à Polícia Federal após live em que Bolsonaro apresentou informações falsas sobre a segurança do processo eleitoral brasileiro. Também foi acusado de cometer crime ao divulgar fake news sobre a Covid-19 e é investigado em inquérito comandado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para apurar a operação de um suposto “caixa paralelo” do ex-presidente.

A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, que seria a destinatária das joias doadas pela monarquia saudita, negou que soubesse do presente. O próprio Bolsonaro também se manifestou, e disse que não houve qualquer irregularidade no episódio.

— Estou sendo acusado de um presente que eu não pedi, nem recebi. Não existe qualquer ilegalidade da minha parte. Nunca pratiquei ilegalidade. Veja o meu cartão corporativo pessoal. Nunca saquei, nem paguei nenhum centavo nesse cartão — declarou o ex-presidente em entrevista à CNN.

Ex-integrantes da gestão Bolsonaro alegam que o governo pretendia recuperar as joias apreendidas para que elas fossem destinadas ao acervo oficial da Presidência. Ao menos três ofícios mostram que o argumento foi utilizado nas tratativas com a Receita. 

O Fisco, por sua vez, disse que esse encaminhamento exigiria “pedido de autoridade competente, com justificativa da necessidade e adequação da medida". "Isso não aconteceu neste caso. Não cabe incorporação de bem por interesse pessoal de quem quer que seja, apenas em caso de efetivo interesse público", disse a Receita, em nota.

O caso foi encaminhado para apuração da Polícia Federal e do Ministério Público Federal.


Fonte: O GLOBO