Decisão pode, por um lado, reduzir potência da política monetária. Por outro, analistas veem risco de redução da credibilidade do BC e diminui espaço para redução dos juros
Apesar das críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos juros e da perspectiva de debate no governo sobre o tema, economistas avaliam que uma revisão das metas de inflação não seria o mais acertado em termos de política econômica.
Alessandra Ribeiro, economista da Tendências, avalia que ainda é cedo para falar em espaço para corte de juros este ano diante dos rumores de que o governo vai mexer na meta de inflação em fevereiro.
— Não tem nenhuma discussão com os agentes de mercado com argumentos técnicos para defender essa essa elevação da meta, e a forma como está acontecendo esse tipo de posicionamento em relação ao BC gera uma incerteza tremenda. O Banco Central fica sob ataque.
2 de 2 O ministro Alexandre Padilha ao lado do presidente Lula, que tem feito duras críticas ao Banco Central — Foto: Cristiano Mariz/Agência O Globo
O principal risco que se cria, diante dos anúncios de mudanças nas metas de inflação é a consequente impossibilidade de freio na inflação. Isso porque, se o BC perde credibilidade, o dólar sobe, o mercado continua aumentando as expectativas de inflação e inviabiliza espaço para redução dos juros, lembra Alessandra:
— O câmbio pode ter depreciação importante e isso afeta preços que tem os parâmetros internacionais. E, conforme as expectativas de inflação são reajustadas, produtores que utilizam esses parâmetros reajustam preços. Ficamos no pior dos mundos: atividade fraca, inflação mais alta e um BC que não consegue reduzir juros nesse contexto. É só tiro no pé.
Para Lula, a meta de inflação mais alta abriria caminho para o BC reduzir adiante os juros. Mas economistas ponderam que a mudança gera incertezas e pressiona o dólar, que tem impacto sobre uma série de preços, incluindo alimentos. E é o aumento nos preços da comida que afeta a população mais pobre.
— Ao contrário do que podem achar, de que uma revisão da meta possa abrir espaço para o BC cortar juros, a gente entende que isso dificulta o trabalho do BC, piora as expectativas e o obriga a ser mais duro mantendo o nível da Selic elevado por mais tempo — afirma Carlos Lopes, economista do BV.
Para Flavio Conde, analista da Levante, é preciso rever a meta, mas mudá-la para 3,5%, por exemplo, não seria suficiente:
— É difícil baixar a inflação para a meta atual. Isso só aconteceria a custo de recessão e desemprego, o que nem governo, nem oposição querem.
Luciano Rostagno, economista-chefe do banco Mizuho, trabalha com o cenário de que o governo Lula provavelmente terá uma meta de inflação mais alta do que a atual. Ele avalia que o governo tende a preferir bancar uma inflação maior nos próximos anos para entregar um crescimento econômico maior. Mas essa não é a melhor decisão, diz:
— Essa estratégia do presidente pode ser contraproducente. Na cabeça dele, se aumentar a meta o BC vai ter espaço para cortar juro. Mas muito provavelmente vamos ver, se houver essa mudança na meta, uma revisão altista das expectativas de inflação e desvalorização do câmbio que também favorece inflação mais alta. A melhor estratégia seria dar sinais claros de responsabilidade fiscal.
Rostagno ainda vê espaço para corte de juros este ano, com a Selic ficando em 12,75% no fim do ano, mas com consequências adiante:
— Uma coisa vai acabar anulando a outra. O espaço para corte de juros tem um custo lá na frente, com uma percepção de que a taxa de juros real neutra da economia vai ser mais alta e a taxa de inflação também. Então o BC vai vai ter menos espaço para cortar juntos lá na frente.
Fonte: O GLOBO
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