Ex-presidente da Casa, que foi cassado e preso, opinou até na escolha do gabinete de Dani, eleita deputada pela primeira vez

Sete anos após ter seu mandato cassado, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha voltou a cruzar o plenário cheio da Casa no último dia 1º. Desta vez, como coadjuvante. Estava ali para acompanhar sua filha e herdeira política, Dani Cunha (União-RJ), tomar posse como deputada federal pela primeira vez.

Com o broche de parlamentar na lapela, ele andava com desenvoltura pelo Congresso e tentava convencer os interlocutores que, a partir de agora, não seria o protagonista da família.

Cunha afirma que a deputada tem muitas de suas qualidades, mas pouco de seus defeitos. A vitória dela, na prática, reabre as portas da política para ele. Cunha passou quatro anos preso, de 2016 a 2020, após ser condenado por diferentes crimes, como corrupção e lavagem de dinheiro.

— A Dani não é clã Cunha. Eu nunca quis ter clã — diz.

O ex-presidente da Câmara tentou voltar por meio das urnas em 2022, sem sucesso. Ele se candidatou a deputado federal por São Paulo, mas obteve apenas 5.044 votos. Cunha admite que o seu capital político no Rio elegeu Dani, com o apoio de 78,5 mil eleitores. Ambos trabalharam ativamente pela vitória dela.

Orientações

O ex-presidente da Câmara apresentará à deputada debutante os atalhos que conheceu em três décadas de política. Após o carnaval, ele já vai se hospedar no apartamento funcional de Dani em Brasília.

— A Dani tem um consultor acessível, mas não tem um tutor do mandato — disse Cunha na última quarta-feira no lobby do hotel em que costuma ficar na capital federal.

Ele opinou até sobre a escolha do gabinete da filha. Por ser mulher, ela tem preferência no sorteio e, sob orientação do pai, escolheu um espaço no nono andar do anexo IV. Entre as vantagens citadas pelo ex-deputado, a sala estava reformada, fica sob o restaurante e tem vista para a Esplanada. Três ex-funcionários de Cunha trabalharão com Dani.

Nos bastidores, o ex-deputado dá conselhos para que a filha construa a sua própria identidade política.

— Não herde minhas inimizades, tenha suas próprias brigas — costuma dizer para ela.

Dani acompanhou o pai de perto, do auge à cassação, em setembro de 2016. Ela é, inclusive, coautora do livro “Tchau, Querida: O Diário do Impeachment” (Matrix).

Dani herdará, além de votos, as alianças do ex-parlamentar. Ela está cada vez mais próxima do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), amigo de seu pai, que também já liderou o Centrão.

Durante a campanha à reeleição de Lira, a deputada esteve ao lado dele em diversos encontros. Dani mantém ainda contato frequente com lideranças como o líder do Republicanos, Hugo Motta (PB), um dos homens de confiança de Cunha na Casa.

A interlocutores, Cunha gosta de discorrer sobre o currículo de Dani, que é publicitária. Segundo o pai, ela fala quatro idiomas e tem o trabalho voltado para o empreendedorismo, que deve ser uma de suas principais bandeiras.

Na semana passada, Cunha disparou de seu celular para jornalistas o requerimento apresentado pela filha para a realização de uma sessão solene em homenagem à jornalista Glória Maria, que morreu no dia 2, e um projeto para a criação de uma medalha em nome da profissional.

Dani conta que o pai lhe aconselha sobre a importância de dialogar, construir boas alianças e se fazer presente para ocupar espaços. Diz, porém, que a participação dele no mandato se encerrará aí.

— O papel não é o do presidente Cunha e, sim, do Eduardo, pai — diz. — Tenho opiniões e pautas diferentes.

Filha do político que surfou no antipetismo e comandou o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, Danielle agora prega diálogo com o governo Lula, embora rechace aderir a ele:

— Vou fazer oposição, mas sem ser radical. O momento pede diálogo.


Fonte: O GLOBO